Hoje passei a noite na rua, ao frio, às voltas com uma cadela que se tentava a custo purgar com o escasso verde que brota no cimento das ruas contíguas à minha, emitindo estranhos sons, esboços de vómitos, regurgitações. Fiz-lhe massagens, disse-lhe palavras ternas, só faltou segurar-lhe a testa para se poder inclinar para a frente, como fazem as mães aos filhos. Cansada(s), regressámos a casa. Sentei-me no chão do hall da entrada e encorajei o encorajável: que me vomitasse a casa. Depois de muito esforço, lá conseguiu. E eu, com o meu lar conspurcado, verbalizei também o impensável: "Linda, a Kika é linda!". A tarefa estava terminada para ela que, tranquila, se foi deitar no ninho, para só acordar hoje já o dia tardava, com o costumeiro apetite devorador. A mim coube-me a outra parte, a mais difícil, e de sacos de plástico enfiados até aos cotovelos iniciei a empreitada. Quando no meio daquilo tudo me deparei com uma tampinha amarela e um caroço de pêssego, passei-me. Conferi cada frasco cá de casa... nada. Nem um sem tampa. Também na fruteira faz tempo que não constam esses frutos. Palavra de honra que não sei onde ela vai buscar aquilo! Só sei que hoje, lá para as quatro e meia da manhã, lhe vou despejar um pacote de leite de soja no ninho. Olécas!