Fui ontem ver o "Shame". Um filme sobre a solidão, como um homem e uma mulher a (sobre)vivem. Ele, refugiando-se atrás da frieza de um escudo e de um falso equilíbrio que o faz parecer intocável, mas a todo o momento capaz de ruir ao mais pequeno toque. Ela, implorando afecto, autodestruindo-se para sobrepor a dor física à emocional, ou mesmo acabar com ela de vez. Um filme sobre a dificuldade de comunicação: a incapacidade dele em verbalizar emoções, de as aceitar, de as reconhecer, até, e o exagero dela em manifestá-las, em mendigá-las. Duas pessoas sós, tão sós, dois irmãos perdidos na impotência de um abraço quando é, tão só, isso o que ambos precisam.
Deliciosa esta Madame Souza com o seu eterno amor pelo neto; delicioso este cão Bruno eternamente fiel aos seus donos; deliciosas estas Triplettes de Belleville eternamente solidárias para com os outros.
Porque há vidas (des)encantadas e sim, as fadas existem!
Num mundo onde a realidade é violenta, sádica, cruel; onde morrem os que amamos e muito poucos estão dispostos a cantarem-nos canções de embalar; num cenário frio, degradado, sanguinário e assustador, o que resta a uma menina de treze anos senão a imaginação? Nela existem fadas que lhe indicam o caminho, “papões” que morrem quando provas são superadas, portas que se abrem ao simples riscar do giz. Ofélia acredita, e nós, espectadores, miraculosamente, somos levados a isso também. Paralelamente, assistimos a um cenário de guerra, de tortura, de medo. Mas também de resistência. E, é de coração apertado que vemos Ofélia morrer. É com um embargo na voz que testemunhamos, finalmente, o seu sofrimento acabar. Mas também com um sorriso. É que a mortal Ofélia não é mais do que a Princesa Moanna - que viverá feliz para sempre - na eternidade.