Sábado, 21 de Dezembro de 2013
Abraça-me, Meu Amor, embala-me, como se faz aos bebés. Não digas nada, não confesses nada. Sussurra-me apenas esta mentira: “vai correr tudo bem”.
Domingo, 15 de Janeiro de 2012
"(...) Este ente tem a arrogância típica dos que se acham onipotentes. Criador de tudo que conhecemos, acha que todos devem curvar-se a sua vontade: "Não terás outros deuses diante de mim" é seu lema.
No mito Gnóstico o Demiurgo foi gerado pelo eon Sophia após sua queda. Ao ser gerado, criou o mundo material com o objetivo de governar e aprisionar na matéria as partículas divinas provenientes de sua mãe (Sophia).
Querendo libertar as almas aprisionadas ao mundo material, Sophia rebela-se contra o Demiurgo, e o verdadeiro Deus Inefável envia aos homens o seu filho mais querido, o eon Christós ou Cristo que desce ao mundo material com o objetivo de transmitir a "Gnosis" (conhecimento) às almas para que elas tenham consciência de sua identidade divina e partam para o Pleroma libertando-se do jugo e da escravidão do Demiurgo.
Com o objetivo de impedir que isso ocorra, o Demiurgo cria inúmeras ilusões e prazeres materiais efêmeros para afastar as Almas de sua legítima parcela divina, de modo que estas estejam presas e sejam escravas do mundo material, tendo que sempre a ele retornar (reencarnação). O Demiurgo é o governante desta pequena Esfera de Vida onde reina absoluto."
[in Wikipédia]
Quinta-feira, 30 de Abril de 2009
Imagem: The collection of erotic photos XIX-XX century
Demiurgo descobriu o Facebook. Assina Demiurgo Bernardo d` Eça. Assim mesmo, com três nomes como todo o homem de bem naquela rede social, e apóstrofo. Escreve sábias frases de refinado humor político no mural, mas no chat conversa com mulheres de carnes fartas que dão pelo nome de Elisabete ou Carmem. Troca com elas fotografias menos próprias – ele de ceroulas, a esconderem-lhe debalde a erecção tímida; elas escancaradas, a oferecem-lhe o sexo ou a apelarem-lhe, desavergonhadamente, a ele.
E sozinho, à noite, de lunetas encarrapitadas no nariz aquilino e de olhar atento, já desapossado de paletó e fato, dá-se aos prazeres do onanismo, enquanto lhes contempla regozijado as redondas nádegas brancas.
Quarta-feira, 2 de Maio de 2007
Nos tempos em que ainda se amavam, Lunata e Demiurgo entraram no Club, em West End, London, vestidos a rigor. Ele, de smoking e sapatos brilhantes; ela, de longo vestido de chiffon de seda e colar de pérolas. Cumprimentaram os cavalheiros, beijaram as senhoras, e deslizaram pelos salões, dançando, num swing perfeito. Pararam na imensa varanda que dava para o jardim e, sob a luz cúmplice da Lua, ele disse-lhe, baixinho, ao ouvido, aquilo que mais ninguém pôde ouvir. Ela riu, uma gargalhada farta que lhe atirou a cabeça e o sumptuoso cabelo enfeitado com minúsculas pérolazinhas, graciosamente, para trás. Ele piscou-lhe o olho, e apertou-a, assim, num abraço sentido, junto ao peito, como fazem os apaixonados. Lord Harold e Sir James, cuspindo elegantemente baforadas dos seus poderosos charutos, invejaram-no pela companhia. E pelo estado de espírito! Countess Anne e Lady Cordelia invejaram-na a ela. Pela sua beleza e pela sua, genuína, alegria.
Mal eles sabiam…!
Sábado, 10 de Fevereiro de 2007
E foi assim, a fazer lembrar um antigo – famoso – político lusitano que Demiurgo, enganado, tombou violentamente da cadeira onde se encontrava sentado.
Vimo-lo, há pouco, sair da séptica Urgência do Hospital de São João, de braço ao peito e cabeça, qual múmia, envolvida de brancos esparadrapos.Nota: O Bar Aldebarã é um projecto e ideia única e exclusivamente da autoria e responsabilidade dos escritores Manuel Jorge Marmelo e Paulinho Assunção, sobre o qual eu, com o conhecimento e consentimento dos autores, volta e meia, escrevo.
Quarta-feira, 7 de Fevereiro de 2007
Porta Norte do Bar Aldebarã (Fotografia retirada daqui)
Desde ontem que Demiurgo vigia o Bar Aldebarã ancorado, desde o inicio da semana, na Avenida dos Descobrimentos, na Póvoa de Varzim. À noitinha, espiou-lhe o caramanchão e a entrada sul, galgou-lhe o jardim e fez sentinela à porta norte. Não viu luz alguma. Não ouviu qualquer voz. Não sentiu vivalma.
Hoje, palmilhou a marginal sob uma irritante e incontinente chuva miudinha e não reconheceu nos transeuntes Machado de Assis, Cida La Lampe, ou Lucas Baldus.
Voltou à entrada principal do Aldebarã e releu o “Noticiário de uma curta ausência” afixado a maiúsculas nos vidros foscos e trabalhados, art noveau, do estabelecimento.
Magicamente, como naqueles livros em que as letras aparecem e desaparecem sem deixar mácula, notou que os pontos 6, 7 e 8 de tal aviso tinham sido substituídos por outros. Onde antes era aceite a sugestão de Eça de Queirós em mudar o bar para o local onde decorriam as Correntes d`Escrita, estava agora impresso: “A sugestão não foi ainda de todo aceita devido a certos inconvenientes…”.
Demiurgo ajustou o monóculo ao olho esquerdo e mirou, de alto a baixo, o imponente edifício que se lhe afigurava defronte.
– Homessa! Mas que o bar aqui está, está! Ou estarei eu a sonhar?! [SBB]Nota: O Bar Aldebarã é um projecto e ideia única e exclusivamente da autoria e responsabilidade dos escritores Manuel Jorge Marmelo e Paulinho Assunção, sobre o qual eu, com o conhecimento e consentimento dos autores, volta e meia, escrevo.
Quarta-feira, 15 de Março de 2006
“— Como é que gosta das mulheres, Daniel?
— Não sei muito de mulheres, para dizer a verdade.
— Saber, ninguém sabe, nem Freud nem elas próprias, mas isto é como a electricidade, não é preciso saber como funciona para apanhar um choque nos dedos”.
Em “A Sombra do Vento”, de Carlos Ruiz Zafón, edição portuguesa da D. Quixote.
Contra esse tipo de choques não há protecção que o valha: nem botas de borracha, nem fios de terra, nada. O truque é fazer aquilo que se faz nas reacções alérgicas para evitar outro tipo de choque, o choque anafiláctico: ir-se expondo gradualmente, em doses sucessivamente maiores, a fim de que o organismo acabe por se habituar àquele corpo estranho.
Ás vezes, este método também não resulta, mas, olhe, meu caro amigo, em último caso, existe sempre a epinefrina.
Pior, mesmo, é nem experimentar!
Segunda-feira, 20 de Fevereiro de 2006
Eu bem me parecia que Erre Manesse nos está a tentar enganar desde o inicio, que não é o contista de Jehru Bestseller, coisa nenhuma, e que aquele bilhete escrito a letras góticas, afixado na porta leste do Aldebarã em meados de Janeiro, não passou de uma nota falsa para nos despistar a todos.
Ainda recordo a face apavorada de Demiurgo a assomar-me à ponta da Montblanc, os seus delírios numa língua antiga, as referencias ao Zarapelho, ao Barzabum, ao Beiçudo… e de como resolvi aquilo muito prontamente, atribuindo-os a febres e enfiando-lhe dois BenUrons e duas aguardentes no bucho. É que às vezes os escritores também cometem erros e, não darem o benefício da dúvida aos seus personagens, é um deles.
Mas agora leio Paulinho Assunção que relata que viu Erre Manesse examinando-se ao espelho, procurando sinais de mutação no seu rosto, buscando vestígios filiformes exagerados e, mesmo sem os ter encontrado, ter voltado para junto dos demais com aquela expressão alucinada, única daqueles que já estiveram na presença do Chifrudo.Nota: O Bar Aldebarã é um projecto e ideia única e exclusivamente da autoria e responsabilidade dos escritores Manuel Jorge Marmelo e Paulinho Assunção, sobre o qual eu, com o conhecimento e consentimento dos autores, volta e meia, divago.
Quarta-feira, 18 de Janeiro de 2006
Demiurgo regressou ao Aldebarã nessa noite.
Deparou-se à entrada com um Camões elegante, bem vestido, de collants acetinados, branco-pérola, de fazer inveja à Donzela dos Muitos Prazeres, e, no olho, uma pala preta, brilhante, de onde sobressaía, numa pedraria fina de diamantes, o logótipo da casa Dior.
Perdia-se com o porteiro do estabelecimento, um tipo alto, cavalão, todo ele chumaços e volumetria, numa discussão acesa sobre o amor que garantia ser fogo que arde sem se ver, ferida que dói e não se sente, enquanto o outro, de ar céptico e mente muito menos elaborada, parecia ter escrito no olhar escuro de toiro Ribatejano uma forma bem mais simples e brejeira de o descrever.
Thomas Mann também lá estava. Numa das muitas salas do Aldebarã montara a sua Montanha Mágica que deliciava as memórias de infância dos ilustres. Era vê-los fazerem fila para jogar! A brincadeira consistia numa corrida em que dois concorrentes, depois de terem tomado uma mágica poção de que só Mann conhecia o segredo e que os fazia diminuir a um tamanho minúsculo, tinham de percorrer um sinuoso caminho até ao topo da Montanha, passando por túneis, parando em estações, dando passagem a rebanhos de ovelhas, subindo caminhos íngremes… entre muitos outros obstáculos. Ganhava quem primeiro chegasse lá cima, ao belíssimo sanatório, se metesse mais rapidamente na cama e enfiasse primeiro o medidor de febres na boca.
A confusão instalou-se quando todos queriam ser os primeiros a jogar. Ouve quem fizesse birras, histerias, choradeiras. Eça de Queirós amuou. Pegou-se ao estalo com Proust que o acabou por vencer. E Eça foi aninhar-se no chão, a um canto, emburrado, de braços cruzados sobre o peito e ar zangado.
Alguém teve a ideia de se implementar um sistema de senhas que garantisse a ordem naquele tumulto. Mas não resultou, pois todos reclamavam, também, o lugar pioneiro na recolha da dita rifa.
Fernando Pessoa negou-se a tomar o antídoto da poção, para regressar ao seu tamanho normal. Queria ser piquinino, dizia convicto, numa voz infantil.
Já a noite ia alta quando Demiurgo deixou o Aldebarã. Pessoa dormia a sono solto ao colo de Milena que se deliciara a dar-lhe o peito, assegurando-lhe, depois, as palmadinhas nas costas para lhe garantir o arroto e o mimara, ternamente, até adormecer, com belas canções de embalar. [SBB]
Nota: O Bar Aldebarã é um projecto e ideia única e exclusivamente da autoria e responsabilidade dos escritores Manuel Jorge Marmelo e Paulinho Assunção, sobre o qual eu, com o conhecimento e consentimento dos autores, volta e meia, divago.
Segunda-feira, 16 de Janeiro de 2006
A dúvida
Afinal, Demiurgo não sabia se sonhara, ou se chegara, na realidade, a entrar no Aldebarã.
Acordou confuso, de cabeça pesada, tonto, na boca um travo amargo que poderia, tanto, ser da mistura dos taninos dos Suspiros de Musa, como dos comprimidos que tomara de véspera, ao deitar-se, acompanhados de dois generosos copos de água-ardente que se encarregaram de o tranquilizar durante o sono.
Recordava uns olhos vítreos, rubros, demoníacos que poderiam, perfeitamente, ter sido os seus, tais foram as violentas febres que o assomaram nessa noite, privando-o de sentidos e razão. Lembrava um M. que ora o olhava, ora dormia, aninhado, sob uma mesa, mas essa, parecia-lhe semelhante às da confeitaria da baixa da cidade onde, por vezes, M. cochilava, enquanto esperava por Amina ou lá como ela se chamava.
Demiurgo não sabia. Em todo o caso, estava decidido, passaria novamente pelo Aldebarã nessa noite. [SBB]
Com ou sem Demiurgo, a história continua, naquele que é já o meu preferido bar da blogosfera.
Nota: Para que não haja azo a confusões, fiquem os leitores sabendo que o ilustríssimo Bar Aldebarã é um projecto e ideia única e exclusivamente da autoria e responsabilidade dos escritores Manuel Jorge Marmelo e Paulinho Assunção, sobre o qual eu, com o conhecimento e consentimento dos autores, volta e meia, divago.
Terça-feira, 10 de Janeiro de 2006
Longe vão as tardes em que, ela e Demiurgo, a bordo de uma lapa gigante, rumavam, mar alto, a casa de Senhor Búzio.
Outras vezes, porém, quedavam-se, de barriga para cima, na macieza de seu colchão, a cumprimentar o sol, que os saudava, sorridente, com um magnífico bronzeado.
Na espiral que era a arquitectura da sala de estar de Senhor Búzio, tomavam, deliciados, uma, ou mesmo duas, minúsculas chávenas de chá de alga verde, enquanto, numa amena cavaqueira, prolongavam a tarde até o sol se pôr.
Depois, já a noite começava a deixar sair as primeiras estrelas, regressavam à costa, exaustos, mas felizes, no dorso de uma bela gaivota azul.
[Contado pela Eterna Descontente, © Sofia Bragança Buchholz]